Enfim encontrei...
02:31
Nunca foi algo pelo qual procurei
durante muito tempo. Talvez nem ao menos tenha, de fato, tentado procurar. Eu
sempre gostei de penumbras, de coisas meio expostas, meio iluminadas, de meios.
Coisas descompassadas, perenes, de pouca utilidade para o mundo e para mim.
Naquele caos incompreensível, era difícil encontrar alguma coisa que fosse
sólida, ou fosse ao menos mais apoiável
que o amor ou a saudade. Não havia nada parecido, afinal as coisas tinham uma
trágica essência de serem excludentes e também paradoxais.
E
ao passo que nunca havia sequer tentado procurar, também nunca havia se dado ao
trabalho de vir até mim. Talvez porque nunca fora evocado, ou sempre estivesse
à margem de uma situação, sempre deixado em último plano, ou nem fosse um
plano. Era nada, ou era sim alguma coisa, só que facilmente descartável. Alguma
coisa que não cabia no espaço de tempo, nas memórias, nos pensamento e em si
próprio. Era algo desconcertante e talvez um pouco melancólico, como tomar café
às três da manhã porque é impossível dormir; ou viver.
Não
havia muito esforço em dizer adeus, que sempre fora apenas uma justaposição de
vogais e consoantes. O que existia por trás do gesto de dizer a palavra era
outra coisa fora do plano da compreensão. Era algo inominável, incabível, mas
que dava a sensação de que estava tudo bem mesmo que caos fosse a única
descrição possível para algum momento de horror. E que nem era horror, mas era
como se fosse. Os fragmentos daquilo que havia encontrado estavam soltos por
aí, um pedaço cortante em cada parte do mundo onde eu não podia ir nem em pensamento.
Era uma personificação da distância em pequenos pedaços de amor, ou saudade. De
que se nunca fora nada senão sensação errante? Nunca materialização de uma
existência longínqua que quanto mais se distanciava mais insistia em mostrar que sim, sim! Valia a pena lutar por. Choveu e eu ao menos percebia enquanto chovia.
Mas
agora era meu, mesmo que me pertencesse junto à solidão de amar aquilo como se
ama algo que deve ser amado e não esquecido. Era meu, e exclusivamente meu,
porque apenas eu poderia sentir e atribuir um nome. Mas preferia que
permanecesse desconhecido, ou que eu chamasse de algo que eu só poderia
entender e verbalizar para mim. Eu havia encontrado e era meu, mesmo que não
fosse certo ser, mesmo que eu devesse abandonar um pedaço perto de mim junto
aos tantos outros espalhados por aí. Era errado pensar em abrir mão do que ao
mesmo tempo em que feria, curava. Feria porque era inalcançável, curava porque
era puro.
E
uma hora eu teria que deixar para trás embora houvesse encontrado. Não poderia
pertencer-me para sempre porque a sua essência própria sempre fora a liberdade.
Eu deveria deixá-lo ir porque aquilo começaria a ferir mais que a curar. Não
seria mais simultâneo, seria transgressor. E a pior parte, a coisa mais
difícil, o erro mais doloroso e a decisão mais degradante era ter de deixar ir
depois de, enfim, ter encontrado.
2 comentários
" E a pior parte, a coisa mais difícil, o erro mais doloroso e a decisão mais degradante era ter de deixar ir depois de, enfim, ter encontrado." Só esse trecho daria um longo texto falando do assunto e pra mim ele resumiu bem o que seu texto quis passar. Às vezes quando finalmente encontramos algo que nos faz bem já é hora de dizer adeus.
ResponderExcluirOi, Júlia!
ResponderExcluirA intensidade da sua prosa poética é dura, porém comovente. Gosto de textos assim, porque eles vão de forma intensa até todas as feridas que deixamos de lado na expectativa de que se curem sozinhas. Textos como o seu, nos colocam para pensar nos nossos eus.
Adorei o desfecho! :)
Beijos,
Fê
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